Dom Teodoro Mendes Tavares, bispo auxiliar de Belém, mostra seu lado humano nessa entrevista, que mais parece o relato de um homem nascido para amar a vida.
Há menos de um mês em Belém, o bispo auxiliar da Arquidiocese, Dom Teodoro Mendes Tavares, já foi delegado pelo Arcebispo Metropolitano de Belém, Dom Alberto Taveira Corrêa, para algumas responsabilidades na Igreja em Belém, como a fomentação do projeto de instalação da Universidade Católica da Amazônia, da criação da Pastoral Ribeirinha e da Pastoral Ecumênica.
Em entrevista à Voz de Nazaré, Dom Teodoro se mostra uma pessoa iluminada constantemente pelo Espírito Santo, que é o padroeiro de sua congregação. Com um sorriso farto, alegre e honesto, ele fala de sua "família episcopal", destacando a amizade com Dom Alberto e Dom Vicente Zico, Arcebispo Emérito de Belém. Ao confessar-se devoto de Nossa Senhora, mostra sua coragem de um missionário guiado por Deus.
◊ Quais os momentos mais marcantes de sua infância e juventude em Cabo Verde?
♦ Eu nasci em Cabo Verde, na ilha de Santiago. Cabo Verde é um arquipélago formado por dez ilhas. Santiago, maior ilha de Cabo Verde, tem como capital a Cidade da Praia, onde fui ordenado bispo por Dom Alberto Taveira. Mas sou originário de uma aldeia chamada Principal. Nasci em uma família católica. Meus pais eram da Legião de Maria, meu pai também era catequista, eram empenhados na Igreja. Minha infância foi tranquila, no meio de vários irmãos. Sou o oitavo filho. Fomos dez irmãos, mas o mais velho já faleceu.
Tive a graça de nascer no seio dessa família, não que queira engrandecê-la, mas os valores que vivo recebi da família, como fé, educação, honestidade, responsabilidade, formação para a vida. Não somos uma família rica, mas sempre tivemos o necessário para uma vida normal. Os meus pais procuravam sempre trabalhar para ganhar a vida de forma digna. Eu próprio participava dos trabalhos da família. Meus pais tinham terrenos e trabalhávamos na agricultura. Isso me ajudou a valorizar o trabalho, que dignifica, honra e realiza a pessoa.
Ao mesmo tempo em que estudava, dava também essa colaboração. Fiz o estudo primário na minha aldeia, depois fui para a Cidade da Praia estudar no seminário e frequentava as aulas no liceu, a escola secundária.
A ideia de ser padre sempre me cativou. Quando criança, ver o padre paramentado no altar, quando ia à missa com minha família, era muito bonito. No princípio achava que era um sonho distante, que não iria ter essa oportunidade. Mas, graças a Deus, antes de terminar a escola primária surgiu a oportunidade de ir para o seminário. Foi uma grande felicidade. No início tive algumas dificuldades. Meu pai faleceu e eu nunca tinha estado longe de casa. Foi um desafio afetivo muito grande ficar longe de minha mãe, da família. Depois, quando, me adaptei melhor, caminhei sem sobressaltos, sem problemas maiores. Tive alguns desafios, momentos de incerteza e dúvidas, mas na juventude isso é normal para ver o que realmente se quer.
Sempre tive a impressão de que Deus tinha me chamado para ser sacerdote. Depois veio o sonho de ser missionário devido às congregações missionárias em Cabo verde, incluindo a do Espírito Santo. Meu pároco era dessa congregação, um grande pastor, que deixou saudades em meu coração por ter me ajudado muito na caminhada vocacional. Terminei o ensino secundário e fui para Portugal, por volta de 1984, onde conclui meus estudos e fiz a formação para entrar no noviciado.
Um ano marcante por criar raízes em Cristo e consolidar a vocação. Fiz estudos de filosofia em Braga, norte de Portugal. Fui para Lisboa, onde estudei Teologia, em 1992. Entretanto, antes, como religioso, fiz a preparação para os votos perpétuos na Polônia, em 1989, em um mês, um período de transição em que o país enfrentava o desafio da mudança do comunismo para a democracia.
◊ A partir da escolha pelo carisma espiritano, como o Espírito Santo se faz presente em seu dia a dia?
♦ Nós sabemos a importância do Espírito Santo na história da salvação, na vida em Jesus Cristo, na Igreja. Na Bíblia, no período da criação, fala-se que o Espírito de Deus pairava sobre as águas. É a ação do Espírito Santo na obra da criação. Espírito que dá a vida, orienta, ilumina, fortalece todos que são ungidos, instruídos, enviados, consagrados. O Espírito Santo é a alma da Igreja, o protagonista da missão. O mesmo Espírito Santo que desceu sobre Jesus no Batismo e o conduziu certo para a missão, vai à sinagoga de Nazaré. Belo é aquele trecho do profeta Isaías, que diz que "o Espírito Santo está sobre mim, o Senhor me ungiu, me consagrou e me enviou para ensinar a Boa Nova aos povos". É o mesmo Espírito que também Jesus transmitiu aos seus discípulos depois da ressurreição e que desceu sobre eles. Espírito Paráclito, consolador, que substitui Jesus Cristo na sua partida, digamos assim, para o Pai. Espírito Santo que conduziu os apóstolos. Vemos isso muito forte em Pentecostes, quando ele veio sobre Nossa Senhora e os apóstolos no Cenáculo. O medo se perdeu e se começou a anunciar a Boa Nova de Jesus Cristo, testemunhas da ressurreição. Mesmo Espírito que recebemos em nosso Batismo, em nossa Confirmação.
Como bispo, fui ungido da mesma maneira e, através dessa unção, recebi a graça para continuar a missão apostólica que vem de Jesus. Que continuemos a ser impulsionados e guiados pelo mesmo Espírito Santo, da verdade, do amor, que nos dá tudo que se precisa para realizar a missão.
A minha congregação, fundada em 1703, em Paris, França, pelo padre Cláudio Poullart des Places, foi unida a outra sociedade, em 1848, formada por Francisco Libermann. Ambos tinham como devoção, pólos da espiritualidade, o Espírito Santo e Nossa Senhora. A congregação então tem duas festas. O Espírito Santo inspira nossa missão e Nossa Senhora é o modelo de todo discípulo missionário porque se deixou conduzir pelo Espírito de Deus para a vontade do Senhor, com docilidade à ação do Espírito Santo. Identifico-me muito com esta espiritualidade e peço a graça de que o Espírito Santo me conduza à missão e Nossa Senhora interceda por mim, coloco sempre estas intenções em minhas orações diárias.
◊ Por falar nisso, o senhor está em uma Arquidiocese mariana, em que a mais bela homenagem à Virgem Maria é justamente o Círio de Nazaré. Como o senhor imagina esta devoção dos paraenses?
♦ Compreendo que se trata de uma grande festa, o povo vibra com ela e isso é bonito. Envolve-me pela minha função como bispo, mas comungo também deste sentimento de devoção, de veneração à Virgem Maria Santíssima, Nossa Senhora de Nazaré, por aquilo que ela foi, é e significa para nós por ser a Mãe de Jesus Cristo, nosso Salvador, sendo fiel ao seguimento de Jesus até o fim. Aquela que nos acompanha e intercede por nós, que se faz próxima da nossa caminhada, aquela que nos deu o maior presente: Jesus Cristo. Por ser ele nosso Salvador, a mãe de Jesus é para nós uma figura de um valor tão grande que não há nem palavras para expressar nossa gratidão a ela. Só podemos agradecer a Deus. A minha alma engrandece ao Senhor porque realizou em Maria grandes maravilhas. Também acredito que ela intercede por mim nesta caminhada que trilho e que ela já chegou, estando glorificada nos céus.
Além de festejarmos como Igreja esta devoção tão grande à padroeira da Amazônia, a festa é um momento de transcendência, além da própria Igreja. Por aquilo que ouvi falar, se começa a perceber que há muitas iniciativas a serem tomadas para preparar bem o Círio, a própria sociedade também se envolve. É uma devoção tão grande que acaba por catapultar toda a vida daqui de Belém. Dá uma projeção à nossa cidade também. O mundo inteiro hoje, devido à quantidade dos meios de comunicação, tem acesso a informações sobre o Círio e muitos querem participar, do Brasil e de fora do país. É uma graça para nós e para a Igreja, que edifica a todos. Vai ser um tempo de intensa vivência de fé e devoção a Nossa Senhora e também de agradecimento a Deus por tantas graças que concede por Nossa Senhora. Um tempo de rezar, evangelizar, renovar espiritualmente. Que se procure ser e fazer esta celebração a Maria de forma correta, sem desvios e excessos que possam criar equívocos à correta devoção e veneração dos santos, em particular a Nossa Senhora que foi coroada como Rainha dos santos. Depois de Jesus, Maria é a criatura mais excelsa.
Vai ser um momento que aguardo com muita expectativa. É muito gratificante poder estar com o povo de Deus, celebrar e testemunhar nossa fé, nosso carinho e devoção a Nossa Senhora de forma pública.
◊ Dom Teodoro, qual é o seu santo de devoção?
♦ Bom, estamos falando de Nossa Senhora e ela significa minha grande estrela, Nossa Senhora de Nazaré. A Mãe de Jesus é um modelo irrepreensível, perfeito de todos aqueles que são chamados e procuram seguir a Deus com fidelidade, amor, como ela fez.
◊ O senhor tem momentos de lazer? O que o senhor faz quando tem a oportunidade de ter momentos livres?
♦ Gostaria de ter e espero ter (risos). Gosto de esportes e pretendo fazer atividades esportivas. Jogo futebol, por exemplo. Gosto também de música e de conversar com as pessoas em um momento agradável de convivência. Também há momentos que a própria vida nos proporciona instantes de lazer e aproveito isso.
◊ Nesses primeiros dias em Belém, como está sendo construída a amizade com Dom Alberto Taveira Corrêa e Dom Vicente Zico, a partir da convivência na residência episcopal e pelos trabalhos arquidiocesanos?
♦ Muito boa. Posso dizer com muita alegria e gratidão que, desde que fui nomeado bispo auxiliar da Arquidiocese de Belém, senti muito de perto a presença de Dom Alberto Taveira, que me acolheu muito bem na Arquidiocese. Antes de vir a Belém, encontrei com Dom Alberto e Dom Vicente em Lisboa e pudemos partilhar um pouco da nossa vida e daquilo que se projetava para o trabalho, de maneira geral. Depois, em minha chegada, minha recepção não poderia ser mais calorosa, bonita e fraterna da parte deles ao me recepcionarem no aeroporto, junto com alguns sacerdotes da Arquidiocese e o povo, demonstrando claramente carinho e amizade. Fiquei muito surpreso. Além disso, quando cheguei em casa estava tudo preparado. Estamos formando realmente uma família episcopal. Em casa, celebramos sempre que possível juntos e fazemos refeições em conjunto. Procuramos conservar momentos juntos, seja de oração ou uma conversa mais descontraída. Com Dom Alberto já me reuni para conversar sobre a vida da Arquidiocese, da nossa Igreja, da caminhada, aquilo que vai ser nossa agenda pastoral, as responsabilidades que me competem como bispo auxiliar. Pretendo colaborar com ele.
Dom Vicente, para mim, é um santo, figura emblemática desta Igreja. O povo sabe melhor do que eu o que ele significa pelas suas ações. Um homem respeitável, venerado e um exemplo a seguir. Dom Alberto vejo como uma pessoa educada, respeitada, bom pastor, amigo presente e atento a ajudar neste processo de inserção inicial. Nosso convívio tem sido muito agradável e estou feliz de estar com eles. Espero que Deus continue nos abençoando para que continuemos esta fraternidade episcopal, essa amizade e convivência saudável. Poderá servir também de inspiração, talvez exemplo, para fomentar a fraternidade prebisteral através de três bispos morando juntos e partilhando nossas vidas.
◊ O senhor disse que se reuniu com Dom Alberto Taveira. Ele já delegou algumas funções para este mês de julho?
♦ Minha agenda está quase cheia, não a minha propriamente, mas a da Arquidiocese, que faço questão que seja a mesma no sentido de estar disponível a servir. Tem algumas coisas que Dom Alberto já tinha agendado para nosso trabalho. Fiquei de acompanhar o dossiê da futura Universidade Católica da Amazônia, em Belém. Já agendamos uma caminhada para que se possa inicialmente partilhar o percurso feito até agora e o que podemos fazer a partir daqui. Já estive visitando o lugar onde será construída, no Centro de Cultura e Formação Cristã, e conversei com o padre Fabrizio Meroni sobre o projeto. Além disse, fiquei de acompanhar a Pastoral Ribeirinha. Aguardo ansioso o momento de visitar as comunidades, ilhas, cidades ribeirinhas. Depois fiquei de ajudar a Pastoral Ecumênica na Arquidiocese e no Regional Norte 2, a pedido dos bispos. Além de outras responsabilidades que a gente partilha em conjunto.
Tenho visitado algumas paróquias e irei, naturalmente, a outras que ainda não visitei, assim como a comunidades religiosas. Aqui na Cúria Metropolitana de Belém tenho atendido muita gente. É gratificante que as pessoas procurem o bispo. Todas as pessoas são atendidas sem distinção e faço isso com muito gosto. Em outubro, por exemplo, já temos várias programações do Círio. Em agosto, mês vocacional, temos muitas atividades também. E com certeza surgirão outras. |
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